quinta-feira, 30 de junho de 2011

Memórias

“ Névoas enchem de um lado e de outro os morros
Tristes como sinceras sepulturas,
Essas que têm por simples ornamento
Puras capelas,  lágrimas mais puras”.
 Assim escreveu Machado de Assis no seu poema “Manhã de Inverno”.

O inverno me remete a lembranças do passado, lembranças tais  que Machado de Assis descreve com precisão.
Os invernos da minha infância foram mais gélidos do que os atuais.
Muitas vezes no vale eu contemplei os morros brancos de gelos, tristes como sinceras sepulturas...não sei se era o caso do poeta, mas para mim, o inverno  roubava a minha esperança...como sairia daquele vale?
Os dias cinzentos escondiam a beleza do campo, até os pássaros se escondiam, imperando assim o silêncio, não só dos pássaros e dos animais, mas também dos  homens.
Assim como hoje, em dias frios e chuvosos, nos escondemos em nossas casas com cobertores e agasalhos, café fumegando, pipoca, filmes...
Muitas vezes nos esquecemos de olhar pela janela, pelas ruas, nas esquinas da cidade, da vila, da vida...
Por vezes afirmamos como Clarice Lispector : ” Não tenho tempo pra mais nada, ser feliz me consome muito”.
É bom estar e ser feliz, mas que a nossa felicidade possa estar em estender a mão também...
Os  invernos da minha infância de tão nublados me impedia  a visão do futuro.
As lamparinas de querosene, neutralizava  a escuridão, mas mesmo assim  o alcance dos meus olhos era limitado.
Minha mãe nos dizia que no inverno os dias são mais curtos e as noites mais longas, sim era verdade, mas as nossas noites, minhas e dos meus irmãos, sem cobertores, muitas vezes no relento, nos parecia eternas!
Almejávamos o  crepúsculos róseos da manhã de sol, e através destes, um futuro além das montanhas geladas.
Sabíamos que a primavera viria em algum momento, mas quando estamos no vale, não conseguimos ampliar nossa visão, a palavra esperança foge do nosso dicionário, da nossa memória!
Em 1990, eu não estava mais no campo, mas sim na cidade de Cascavel, mais precisamente numa casa na Rua Souza Naves, (  embora a verdadeira Luz já havia brilhado na minha vida de modo diferente da tímida lamparina de querosene, a esperança ainda insistia em fugir de mim).
Foi nesta casa que vivi uma das noites mais frias de um inverno rigoroso. Era uma república para moças (meninas), com capacidade para mais de 20 pensionistas.
 Enquanto aguardava “ficar maior de idade” para conseguir um emprego, eu vendia roupas de porta em porta, as vezes trabalhava de diarista para assim pagar a dona da república.
Não demorou muito para eu descobrir que a dona da casa era cafetina. Apesar de ser um lugar horrível esteticamente falando, pensara que era sério, haja vista que era proibida a entrada de homens no local. Eu tinha um namorado na época e este era proibido entrar.
Eu dividia com uma amiga o quarto com um beliche com colchão e um acolchoado oferecido pela casa.
Certo  dia no horário do almoço eu e minha amiga de quarto fomos surpreendidas pela dona do local, ela nos comunicou sorrindo dissimuladamente que havia arrumado alguém (uns homens), para fazermos um programa, afinal, meu namorado era um pobre que nem pode me levar para jantar no dia dos namorados e minha amiga, já fizera outros programas...
Protestei revoltada e, como eu, minha colega se recusou a se prostituir...
Ao chegar ao nosso quarto a noite percebemos que a Cafetina levara o único acolchoado da minha amiga. Por alguma razão o meu fino cobertorzinho estava lá.
Aquela noite foi uma das mais gélidas da minha vida, pois não era apenas o rigor do inverno que me machucava, mas também a frieza daquela senhora que ousara a nos vender...
A noite foi longa, mesmo juntando as camas e jogando as poucas roupas que tínhamos sobre nós não conseguimos nos aquecer e, acordadas, podíamos ouvir o barulho dos carros que buscavam e devolviam  nossas frágeis colegas, que para muitas seriam o começo de um infinito inverno!
Na mesma semana saí de lá, mas sempre que o inverno chega, me lembro das coisas que contemplei naquele gélido lugar.
Talvez por fatos como estes, não consigo ver no inverno a beleza que os poetas vêem!
Não nego que é muito bom se “aninhar”no sofá com minha família, chocolate quente, uma boa sopa, dormir juntinho...entretanto,  eu prefiro os dias quentes de verão e os jardins da primavera!
Estamos na estação do inverno, porém, o inverno da minha alma passou, o que escrevi aqui, são memórias! JESUS AQUECEU A MINHA VIDA e me resgatou do passado!

“O inverno já foi, a chuva passou, e as flores aparecem nos campos. É tempo de cantar; ouve-se nos campos o canto das rolinhas”- Cantares 2:11,12

2 comentários:

Ellen Paulina Costa Oliveira Gaby disse...

Nossa Cleo, que história linda e triste! Triste sim por tudo o que passou, mas linda por Jesus ter restaurado a tua sorte e hoje ter lhe dado vida em abundância! Me emocionou muito o seu testemunho!Beijos quentes no coração neste inverno frio!!!!

Raquel Costa Ventura disse...

"JESUS AQUECEU A MINHA VIDA e me resgatou do passado! "


“O inverno já foi, a chuva passou, e as flores aparecem nos campos. É tempo de cantar; ouve-se nos campos o canto das rolinhas”- Cantares 2:11,12


Que bençoa essa postagem !!

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